Artropatias por cristais Gota
Introdução
Gota é o termo usado para designar em geral as artrites inflamatórias por cristais.
Os cristais patogénicos são:
Urato monosódico
Dihidrato de pirofosfato de cálcio
Hidroxiapatita de cálcio
Oxalato de cálcio
As diferenças na morfologia e nas propriedades físicas dos cristais podem ser vistas através da cristalografia de luz polarizada
GOTA
Introdução
Na gota ocorre:
devido ao aumento da concentração sérica de ácido úrico – hiperuricemia
cristalização do monourato de sódio
em locais privilegiados (articulações,tecidos subcutâneos, rim)
Epidemiologia
Acometimento predominante de
Homens de média idade (H:M ; 7:1) e idosos
Mulheres na pós-menopausa
Mais comum na presença de uma história familiar
Pode ocorrer sobre doença articular degenerativa (nódulos de Bouchard e de Heberden)
Epidemiologia
A maioria dos indivíduos com hiperuricemia não desenvolve Gota
7% da população adulta tem hiperuricemia, apenas 1% desenvolve a doença
Factores predisponentes para artrite gotosa aguda:
obesidade
insuficiência renal
medicamentos (diuréticos, ciclosporina)
consumo excessivo de alimentos ricos em purinas (carne, mariscos) e de bebidas alcoólicas
Também parece haver associação com o Sindrome metabólico
A gota pode ocorrer em doentes com uricemia normal
Fisiopatologia
O ácido úrico é um produto final do metabolismo das purinas
As purinas (guanina e adenina) compõem os ácidos nucleicos que são constituintes de todas as células do organismo
As purinas provêm de
produtos alimentares
produção endógena
Os níveis de urato são mantidos à custa da
excreção do excedente da produção diária
através do rim (elimina cerca de 2/3) dessa produção
através do intestino
Fisiopatologia
Quando é ultrapassada a concentração sérica máxima (6,8 mg/dl), aumenta
o risco de cristalização, sobretudo na presença de condições
favoráveis, como a diminuição da temperatura local ou do pH, que
acontecem essencialmente nas extremidades.
A um nível de 6,8 mg/dl a solubilidade do ácido úrico é excedida e os cristais precipitam
Fisiopatologia
Causas de hiperuricemia
Hiperprodução de uratos
Genéticas (défices enzimáticos no metabolismo de ácido úrico, aumento
da actividade das enzimas envolvidas na sua síntese)
Não genéticas (estados hipercatabólicos, excesso de ingestão alimentar, neoplasias -estados mieloproliferativos, quimioterapia)
Hipoexcreção
Insuficiência renal crónica
Idiopática
Medicamentos que inibem a excreção de uratos
Medicamentos mais frequentemente envolvidos na hiperuricemia iatrogénica são:
Aspirina, diuréticos
Ciclosporina
Etambutol
Pirazinamida
Ácido nicotínico
Ambos
Fisiopatologia
Os cristais de ácido úrico têm propriedades pró-inflamatórias
Os cristais de ácido úrico são fagocitados
Estimulam a produção de citocinas inflamatórias
Desencadeiam inflamação crónica
Na maioria das vezes, essa
inflamação é subclínica e sustida, provávelmente por haver equilíbrio
entre as citocinas pró-inflamatórias e os seus inibidores
Fisiopatologia
Individuos com hiperuricemia
90% são hipoexcretores (insuficiente renal)
10% são hiperprodutores, embora o rim excrete níveis elevados de ácido úrico (hiperexcretores)
Estes factores têm importância na terapêutica:
indivíduos hipoexcretores podem ser medicados com uricosúricos, aumentando assim a excreção de uratos
Individuos hiperprodutores beneficiam de terapêutica inibidora da síntese de urato
Cascata da hiperuricemia
Degradação das purinas a ácido úrico
Produção e eliminação de ácido úrico
Excreção renal
Causas da gota
Manifestações clínicas
Crise gotosa aguda
Artrite gotosa crónica
Nefropatia por ácido úrico
Manifestações clínicas
Podem ser identificados factores desencadeantes para as crises:
Excessos alimentares
Traumatismos
Cirurgia
Excesso de álcool
Interrupção de medicação hipouricémica
Início brusco da terapia hipouricémica
Doenças clínicas: enfarto do miocárdio, acidente vascular cerebral
Manifestações clínicas
A sintomatologia depende do órgãoafectado, ou seja:
doença articular aguda
tofos gotosos
nefropatia ou litíase renal
A. Crise aguda de gota
A apresentação inicial mais comum é a monoartrite.
A articulação mais frequentemente atingida é a primeira metatarso-falângica (50% dos casos), designando-se a crise de Podagra.
Outras articulações envolvidas
articulações do tarso, tibiotársicas, joelhos, punhos ou qualquer metacarpo-falângica
A artrite poliarticular é vista em hipertensos que ingerem alcool excessivamente
Manifestações clínicas
A crise começa geralmente de madrugada, com dor e tumefação, de instalação rápida.
Se for uma articulação superficial, podem surgir eritema e hiperestesia acentuados.
Num
pequeno número de doentes, a crise inicial pode atingir várias
articulações em simultâneo e acompanhar-se de febre ou outros sintomas
sistémicos
Outros podem consultar o médico apenas quando surgem tofos sem queixas de artrite prévia.
Manifestações clínicas
Manifestações clínicas
Os sintomas de dor e tumefação articulares são acompanhadas ao exame objectivo por calor, eritema e hipersensibilidade.
Manifestações clínicas
Sinovite - sinovite assimétrica pode desenvolver-se após vários episódios de gota.
Depósitos tofáceos peri-articulares
Manifestações clínicas
B. Gota crónica
A Gota crónica tofácea resulta da acumulação de cristais em várias localizações; manifesta-se por:
presença de tofos (aglomerados de cristais de monourato):
no pavilhão auricular
tendão de Aquiles
superfície extensora dos cotovelos e dedos
Em geral é doença
arrastada com múltiplas crises agudas de gota prévias, mas pode surgir
em indivíduos praticamente assintomáticos.
Os tofos gotosos podem estagnar, diminuir ou mesmo desaparecer se for instituída terapêutica hipouricemiante eficaz.
Diagnóstico
Os achados clínicos são em geral sugestivos de Gota
O diagnóstico definitivo é confirmado pela aspiração das articulações
Exame do líquido do aspirado articular
Cristalografia : cristais intracelulares em forma de agulha - birefringentes
Exame citoquímico
liquido turvo e espesso
leucócitos: 2000 a 60000/μl
Exame bacteriológico
bactérias se houver sobre-infeção bacteriana
a presença de cristais não exclui uma artrite séptica concomitante
Diagnóstico
Bioquimica
sérica e urinária
O ácido úrico sérico na ocasião da crise aguda pode estar alto, normal
ou baixo.
Porém em algum momento os níveis séricos estão elevados e tem utilidade
na monitorização da resposta ao tratamento hipouricêmico.
A
determinação dos níveis de ácido urico na urina de 24 horas auxilia na:
avaliação do risco de cálculo
demonstração da produção excessiva ou excreção insuficiente de ácido
úrico (a excreção diária de > 800mg de ácido úrico em doente comum
requer estudo da causa de produção exacerbada de purinas)
decisão do esquema hipouricêmico a ser usado
Hemograma
Leucocitose com neutrofilia
Diagnóstico
Exame radiológico:
Crise aguda:
tumefacção dos tecidos moles circundantes
Gota tofácea crónica:
lesões líticas em saca-bocados
massas calcificadas nos tecidos moles.
Na gota crónica existem características radiológicas típicas, apesar de não patognomónicas:
1 – Lesões osteolíticas
2 – Ausência de osteopenia (ao contrário,
por exemplo, da artrite reumatóide, uma vez que as crises são curtas e
insuficientes para causar osteopenia por desuso)
3 – Tumefacção e calcificação dos tecidos moles adjacentes (tofos gotosos calcificados).
4 – Anquilose (nos estados avançados da doença)
Diagnóstico
Em resumo:
Artrocentese
Cristais com birrifringência negativa
Urato sérico
Diagnóstico diferencial
Artrite séptica
Artropatias por outros cristais - Pseudogota
Reumatismo polindrómico
Artrite psoriática
Artrite reumatoide inicial
OA inflamada
Tratamento
Nas últimas décadas, com:
aumento da esperança de vida,
obesidade,
insuficiência renal crónica,
uso de diuréticos e aspirina,
transplantes de órgãos
eficácia da quimioterapia
....a prevalência da hiperuricemia e da Gota aumentou significativamente
Tratamento
Os objectivos do tratamento da Gota incluem o tratamento de:
crises agudas de inflamação articular
prevenção de novas crises
redução da uricemia
diminuição
progressiva da quantidade total de uratos no organismo melhorando assim
as lesões resultantes da sua deposição nos tecidos.
Tratamento
As crises de Gota podem ser auto-limitadas melhorando ao fim de poucos
dias.
No entanto, com a evolução da doença, tendem a tornar-se
cada vez mais frequentes e prolongadas, atingindo em simultâneo várias
articulações.
Tratamento
Tratamento na crise gotosa
Anti-inflamatórios não esteroides (exemplo: indometacina, ibuprofeno ou
diclofenac)
Colchicina
Corticoesteroides intraarticulares (muito eficaz, usado se baixa
eficácia dos AINE e colchicina)
Corticoesteroides sistêmicos
Prednisolona
Metilprednisolona (EV)
Triamcinolona (IM)
ACTH (IM, EV, SC) (nos casos refractários ou com contra-indicação aos
fármacos anteriores – hemorragia digestiva, I.renal)
Tratamento
Terapia hipouricémica
Na presença de hiperuricémica, o tratamento
deve incluir fármacos que reduzam o ácido úrico a <300 mmol/l
(0,5mg/dl) com o fim de:
Reduzir a recurrência das crises agudas de gota
Eliminar os depósitos tofáceos
Tratamento
Terapia hipouricémica
Medidas não farmacológicas
Controle do peso corporal
Dieta com restrição de purinas
Aumento da restrição hidrica
Redução do consumo de alcool
Limitação do uso de diuréticos
Nos doentes obesos,é preferível uma
dieta hipocalórica, hipolipídica e hipoproteica, para controle não só
da uricemia mas também do peso e co-patologias metabólicas
Tratamento
Terapia hipouricémica
Tratamento farmacológico
Indicações;
Crises agudas frequentes
História familiar de gota
Depósitos tofáceos de UMS
Excreção de ácido urico >800 mg/dia
Nefropatia úrica
Risco de nefropatia aguda pelo ácido úrico durante a quimioterapia das doenças hemato-oncológicas
Sinais radiológicos de lesão articular
Os hipouricemiantes não
devem ser iniciados na crise aguda, uma vez que a variação da uricemia
pode prolongar a cristalização e reagravar a crise.
A normouricêmia deve ser atingida lenta e progressivamente
É
fundamental assegurar a profilaxia de novas crises agudas de gota
durante o tratamento, pois os hipouricemiantes não previnem e podem até
desencadear crises agudas, ao alterar o equilíbrio de uratos entre o
sangue e o líquido sinovial
Tratamento
Terapia hipouricémica
Tratamento farmacológico
Tratamento
Terapia hipouricémica
Tratamento farmacológico
Alopurinol
Indicações
Elevada produção de ácido úrico
Elevada excreção de ácido urico >800 mg/dia
Cálculos
Insuficiência renal
Contra-indicado em idosos e I.renal
Mecanismo de ação
Análogo das purinas, inibidor da xantina-oxidase
Dose máxima 800 mg/dia depois reduzir a dose mínima eficazz para manutenção sem suspender por completo para evitar a recidiva
Os hipouricémicos
não devem ser usados durante as crises agudas
uso de colchicina pode ser indicado na presença de crises frequentes ou tofos articulares
Tratamento
Terapia hipouricémica
Tratamento farmacológico
Uricosúricos
nos doentes hipoexcretores
inibe a reabsorção de ácido úrico no túbulo contornado proximal do rim.
A uricosúria aumenta significativamente, pelo que surge o risco de cristalização nas vias urinárias e litíase renal.
Para minimizar este risco, a dose de uricosúrico
deve ser aumentada gradualmente ao longo de 2-6 semanas,
a ingestão de água deve ser sempre superior a 2L/dia,
deve evitar-se o uricosúrico sempre que exista nefrolitíase ou insuficiência renal com TFG < 30ml/min.
Os uricosúricos
actualmente utilizados são:
Probenecida (500 a 2000 mg/dia divididos em doses)
Sulfimpirazona (100 a 600 mg/dia)
Benzebromarona (20-150mg/dia).
Tratamento
Terapia hipouricémica
Tratamento farmacológico
Probenicida
Indicações:
Ausência de disfunção renal
Excreção de ácido urico < 600 mg/dia
Ineficaz se excreção de ácido urico > 1000 mg/dia
Tratamento
Terapia hipouricémica
Tratamento farmacológico
Uricolíticos
Urato-Oxidase (Uricase) é uma enzima presente na maioria dos animais, mas não no Homem, que
transforma o urato em alantoína, uma molécula mais solúvel e mais facilmente excretada na urina.
Esta
reacção tem como produto colateral o peróxido de hidrogénio, que
aumenta significativamente o potencial oxidativo, pelo que parece ter
sido uma vantagem evolutiva dos primatas deixarde possuir a enzima.
A
Uricase (extraída de Aspergillus flavus) tem sido usada em alguns
países no tratamento e prevenção da hiperuricemia associada a
neoplasias e da síndrome de lise tumoral, demonstrando elevada eficácia.
Uricase
recombinante (Rasburicase), que pode ser ou não peguilada, estão
associadas a menor número de reacções alérgicas e mantêm-se em uso para o
tratamento da síndrome de lise tumoral, mas também em estudo para o
tratamento de doentes com hiperuricemia grave e refractária.
Bibliografia
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